O zumbi: a revogação do IPTU progressivo de volta ao debate

Por Paulo Oliveira, professor de filosofia
O IPTU progressivo, várias vezes discutido nesse site, é uma política concreta e razoável para o desenvolvimento das cidades e diminuição da desigualdade socioespacial. Ele visa aumentar as alíquotas para terrenos e imóveis não utilizados ou subutilizados, induzindo o uso. O princípio que o orienta é a ideia de que a propriedade deve cumprir sua função social.
O tema voltou com força graças aos esforços politicamente reacionários do sr. vereador Wilian Tonezi (Patriota). Ele propôs a revogação da lei em Joinville (em que pese, ela própria, ser apenas resultado de leis federais, como a própria Constituição e o Estatuto das Cidades). Sua atividade conduziu a uma audiência pública no dia 23 de junho de 2021. Essa ocasião foi o ensejo para que o mencionado vereador encontrasse os holofotes para seu constrangimento público. Com argumentos que iam do altamente tendencioso ao explicitamente falso, Tonezi não encontrou basicamente nenhuma acolhida (para quem quiser testemunhar a vergonha pública do vereador, pode assistir o vídeo aqui).
A própria prefeitura de Joinville, insuspeita de “marxismo cultural”, defendeu na ocasião o IPTU progressivo, ainda que com a firmeza de um pudim — mas ainda sim. Dado esse revés público, o vereador publicamente se aquietou. Todavia, tramou a recolocação do projeto, no final de 2021. Conforme o jornal O Mirante, aproveitando-se da ausência de Ana Lúcia Martins (PT), explicitamente favorável à lei do IPTU progressivo, e de Henrique Deckman (MDB), favorável com ressalvas, aprovou parecer favorável ao projeto de revogação na Comissão de Finanças, o que leva a lei ao plenário. Muito importante notar: o tema sequer estava na pauta da comissão, foi introduzido repentinamente Isso sugere, de modo evidente, que Tonezi não consegue conduzir sua política às claras e com a devida publicidade que seu cargo demanda; ao contrário, aproveitou para fazer tudo às pressas, no final do ano, manobrando o regimento. Esse é o jeito conservador de fazer política que o vereador que se orgulha de ser um representante destacado — tradição intelectual, aliás, em seu revival atual, absolutamente indigna.
Graças a uma emenda do vereador Deckman o projeto teve sua ida ao plenário adiada para o ano de 2022. Contudo isso é um mero adiamento: é plausível que o projeto de fato vá ao plenário e diante da atual composição da Câmara de Vereadores— na maioria, lamentável — seja aprovado. Ou seja, está-se diante de um confluência dos interesses mais regressivos da cidade somado aos representantes mais desligados do interesse público. Essa lei ser debatida é uma aberração; ela ser aprovada, será a mostra definitiva do descompromisso e descompasso da Câmara de Vereadores com o bem público na sua forma mais elementar.
Por que estamos diante dessa situação? A explicação mais razoável precisa abarcar elementos que vão desde o momento atual da política brasileira — que elevou ao poder uma série de elementos paranoicos, formados no ambiente mais desqualificado de fóruns liberais e conservadores — passando pela ausência e dificuldade da organização de movimentos sociais e populares que pudessem fazer frente a esse tipo de absurdo. Ainda sim, frente a esse contexto adverso, não é pouco significativo que o vereador Tonezi tenha de ter encaminhado o processo todo sem a devida publicidade e sob toda sorte de manobras. Ele sabe que não tem argumentos suficientes e quando veio a público defende-los sofreu uma dolorosa derrota moral e política. Contudo, sua falta de pudor é maior que sua honestidade intelectual e vemos aí o projeto novamente em discussão.
Todas as pessoas interessadas no desenvolvimento de Joinville devem se opor ao projeto do vereador Tonezi e somar forças contra ele em uma frente política que pressione pela sua retirada. O momento é adverso, mas o fato de agir às escondidas mostra que Tonezi sabe da fragilidade da proposta. Não podemos ficar parados.