A Viena vermelha: uma utopia social–democrata
Apresentamos abaixo alguns trechos do artigo «A Viena vermelha: uma utopia social–democrata» de Michael Krätke (Professor de Economia Política na Universidade de Lancaster) traduzido por Hernandez Vivan Eichenberger, colaborador do Observatório Urbano de Joinville. O texto busca recuperar a política implementada na Viena do pós-Primeira Guerra Mundial a fim de garantir moradia pública, desmercantilizar a terra e combater a especulação imobiliária.
«Unicamente em Viena os social-democratas tiveram, entre 1919 e 1934, a chance histórica de implementar sua política habitacional. Viena foi a primeira cidade com mais de um milhão de habitantes na Europa sob a administração social-democrata. Em 1914 havia 2,2 milhões de habitantes, em 1918 eram 1,85 milhões e a população da cidade crescia. Há muito tempo predominava o problema de habitação, isto é, a classe trabalhadora morava em horríveis cortiços construídos e geridos pela iniciativa privada capitalista. Os aluguéis aumentavam incessantemente, de modo que, em média, uma família trabalhadora tinha que dispender entre 20% e 25% de sua escassa renda para o aluguel.»
«Em 1º de setembro de 1923 o conselho municipal social-democrata decretou um plano quinquenal para a construção de moradias. Inicialmente, deviam ser construídas 25 mil moradias. Vale dizer, a partir de recursos públicos, sem participação de capital privado. Já no financiamento se rompeu um aparente condicionante capitalista: os recursos para a construção de casas não valiam como capital, o município não esperava ou requeria nenhum retorno e, sobretudo, nenhum juro ou renda».
«As novas moradias foram construídas no solo de propriedade do município. Visto que os preços dos terrenos em Viena, por causa da proteção ao inquilino e da inflação galopante, sempre caíam, o município podia adquirir terrenos para construção baratos. Isso fez 38% dos terrenos do solo da cidade encontrarem-se, até 1930, sob a propriedade do município».

«A qualidade das moradias que foram construídas era extraordinária. Sobretudo em comparação com os cortiços apertados, sufocantes, sujos e sempre lotados, nos quais a família trabalhadora vienense até então morara. O tamanho das moradias, 48 m² frequentemente menor, às vezes maior), e o padrão de conforto, conforme nossa visão atual, podiam ser humildes, mas para os novos inquilinos elas eram um sonho».

«Até o fim de 1933 foram construídas 61.617 moradias e ainda outras 5.257 casas em bairros populares. Contam-se também as habitações que, em fevereiro de 1934, quando o experimento da Viena vermelha foi interrompido com violência, já estavam em construção e foram até o fim construídas, de modo que o município de Viena, no total de quase doze anos, construiu mais de 65 mil moradias. Mais do que 11% dos moradores de Viena, finalmente moravam em novas habitações municipais, exclusivamente assalariados, trabalhadores e funcionários.»

«O viver e o morar na Viena vermelha eram, para a grande maioria dos vienenses, e também para aqueles que ganhavam menos, algo de fato pagável, por causa dos baixos aluguéis e da proteção aos inquilinos. Mas também por causa da política tarifária para o funcionamento do município. Uma grande parte do serviço de abastecimento — água, eletricidade, gás, transporte público — era de propriedade do município».


O artigo foi publicado originalmente em Zeitschrift für sozialistische Politik und Wirtschaft 3, Heft 232, 2019. . Link para consultar o artigo na íntegra em português: https://www.ifch.unicamp.br/criticamarxista/arquivos_biblioteca/documento2023_03_06_18_47_36.pdf .